Dinâmica do Vírus da Dengue no Camboja
Analisando o aumento dos casos de dengue no Camboja e os fatores que contribuem pra isso.
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Índice
A transmissão do vírus da Dengue aumentou bastante nos últimos vinte anos, alcançando um recorde de mais de 5,2 milhões de Casos em todo o mundo em 2019. Esse número provavelmente é muito menor do que a situação real, já que muitas pessoas que ficam doentes não apresentam sintomas claros. O vírus da dengue (DENV) é principalmente transmitido pelo mosquito Aedes Aegypti, que é encontrado em várias áreas tropicais. O DENV tem quatro tipos diferentes, e ser infectado por um tipo oferece proteção vitalícia contra aquele tipo, mas proteção temporária contra os outros. Se alguém se infecta com um tipo diferente depois de já ter sido infectado por um, a segunda infecção pode ser mais severa por causa de uma reação com os anticorpos da primeira infecção.
O Sudeste Asiático reporta cerca de 70% dos casos de dengue no mundo. No passado, a dengue era vista principalmente como uma doença urbana, mas estudos recentes sugerem que a transmissão também acontece em áreas logo fora das cidades. O Camboja, com uma população de cerca de 16 milhões, é o país menos urbanizado do Sudeste Asiático, mas está vivendo um crescimento significativo dessas áreas peri-urbanas perto de cidades como Phnom Penh. A urbanização e as mudanças climáticas estão colocando mais pessoas em risco de dengue.
A dengue foi relatada pela primeira vez no Camboja em 1963, mas uma guerra civil atrasou o acompanhamento adequado da doença até 1980. Em 2001, o Camboja lançou seu Programa Nacional de Controle da Dengue (NDCP), que começou a usar formalmente diretrizes da Organização Mundial da Saúde para rastreamento de casos. No entanto, o sistema conta principalmente casos severos, o que significa que os menos severos podem não ser relatados. Esforços para rastrear ativamente o vírus começaram em 2001, levando a alguns testes em várias províncias.
Nos últimos vinte anos, todos os quatro tipos de dengue foram encontrados no Camboja, mas geralmente apenas um ou dois tipos dominam em um determinado ano. Grandes surtos ocorreram em 2007, 2012 e 2019, sendo 2019 o pior ano registrado para a dengue no Camboja, com cerca de 40.000 casos. O número de casos relatados tem aumentado constantemente, assim como a idade média dos infectados. Essa mudança de idade pode ser devido ao envelhecimento da população e já foi observada em outros países também.
Fatores por trás dos surtos de dengue
Os surtos de dengue são conhecidos por serem explosivos, mas as razões para esses surtos têm sido debatidas há muito tempo. As mudanças climáticas sazonais influenciam fortemente o número de casos de dengue a cada ano. Em outros países, como a Tailândia, os padrões de surtos de dengue foram associados a mudanças climáticas, como o fenômeno El Niño. Esses ciclos climáticos também parecem se alinhar com o número de casos de dengue. Mudanças na população e nos níveis de imunidade também desempenham um papel nesses surtos.
A forma como o vírus se comporta pode também contribuir para os surtos. Dados históricos mostraram que mudanças no tipo dominante de dengue frequentemente levam a números de casos mais altos. Pesquisas estão em andamento para entender como as diferenças dentro dos tipos de dengue podem influenciar a gravidade dos surtos.
No Camboja, os dados do NDCP mostraram um aumento constante nos casos de dengue, enquanto a idade média dos infectados também aumentou. Investigar essas tendências levou a questionamentos sobre o clima, fatores humanos e o próprio vírus.
Clima e casos de dengue
Para entender melhor como o clima afeta os casos de dengue, os pesquisadores analisaram dados de temperatura e precipitação em todo o Camboja de 2002 a 2019. Eles descobriram que as temperaturas tendiam a subir na primeira metade do ano, enquanto a precipitação atingia seu pico mais tarde. Anos epidêmicos nem sempre se alinharam com anomalias climáticas significativas, o que significa que, embora temperaturas mais quentes e níveis de precipitação aumentem o risco, não é sempre simples.
As análises indicaram que, embora anos mais quentes mostrassem taxas de dengue mais altas, a correlação não era consistente o suficiente para prever surtos apenas com base no clima. Os pesquisadores então usaram um modelo para ver como os fatores climáticos influenciam as taxas de transmissão e tentaram prever o número de casos para anos de surto. Eles descobriram que mesmo com parâmetros climáticos ajustados, os modelos ainda subestimavam os números de casos, o que sugeria que outros fatores também estavam em jogo na disseminação da dengue.
Sincronização de casos entre regiões
Os pesquisadores também investigaram se a sincronização dos casos em diferentes regiões mostrava um padrão consistente durante os anos de surto. Eles usaram análise de wavelet para examinar tendências e descobriram que durante os grandes surtos, havia um aumento na sincronia dos casos em várias províncias, destacando que os padrões regionais podem estar alinhados durante os anos epidêmicos.
No entanto, eles também notaram que os fatores climáticos não podiam explicar completamente o aumento dos casos. Estudos anteriores demonstraram que certos ciclos climáticos multianuais correspondem a números de casos mais altos, mas esses picos nem sempre coincidiam com surtos no Camboja.
Mudanças nos padrões de idade dos casos de dengue
Com a mudança nos padrões de transmissão da dengue ao longo dos anos, os pesquisadores notaram um aumento na idade média dos casos relatados. A análise mostrou que não só a idade média de infecção estava subindo, mas a faixa etária dos infectados também estava se expandindo. Alguns casos foram relatados em indivíduos mais velhos, o que levantou questões sobre como essas mudanças demográficas poderiam estar influenciando a taxa global de infecção.
A queda nas taxas de natalidade e mortalidade no Camboja provavelmente contribuiu para essa tendência, resultando em menos jovens disponíveis para se infectar. Essa redução na força da infecção sugeriu que menos pessoas estavam expostas ao vírus ao longo do tempo, mesmo em meio ao aumento do número de casos durante anos epidêmicos.
Os pesquisadores identificaram um aumento no risco de infecção entre adolescentes e adultos mais velhos em comparação com crianças mais novas. Essa mudança pode ser importante para entender como a imunidade se desenvolve na população e como isso afeta surtos futuros.
Genotipagem e comportamento do vírus
Para avaliar a dinâmica do vírus da dengue no Camboja, os pesquisadores realizaram um estudo genômico mais detalhado em várias províncias. Eles se concentraram em identificar as diferentes cepas do vírus que circulavam durante os surtos de 2019 a 2022. Essa análise revelou a presença de uma nova linhagem de DENV-2, conhecida como linhagem Cosmopolitan.
As amostras coletadas mostraram um padrão de aumento da prevalência dessa nova Genótipo, especialmente em 2019. Os pesquisadores estabeleceram uma conexão clara entre essa cepa geneticamente distinta e o maior número de casos relatados, particularmente entre indivíduos mais velhos durante o surto de 2019.
Ao examinarem a filogenia do vírus, descobriram que a linhagem Cosmopolitan apresentava uma divergência significativa em relação a outras cepas previamente encontradas na região. Isso sugere que a nova cepa pode ter introduzido novos desafios imunológicos para a população, especialmente para aqueles que já tiveram infecções anteriores de dengue.
Modelos de dinâmica de transmissão da dengue
Com os dados coletados, os pesquisadores desenvolveram uma série de modelos para simular a dinâmica da dengue no Camboja. Esses modelos tinham como objetivo replicar as tendências observadas, particularmente o aumento da idade média das infecções relatadas e os picos de casos durante anos de surto.
Os modelos incorporaram vários fatores, como clima, demografia da população e o comportamento do próprio vírus. Eles descobriram que a introdução de um novo genótipo contribuiu para os picos de casos relatados, especialmente entre grupos etários mais velhos.
As simulações indicaram que essas dinâmicas não poderiam ser explicadas apenas pelo aumento das taxas de detecção de indivíduos mais velhos tendo infecções recorrentes. Em vez disso, a introdução de novas cepas do vírus desempenhou um papel significativo na alteração do cenário da transmissão da doença.
Conclusão
O estudo da dinâmica do vírus da dengue no Camboja destaca as interações complexas entre clima, demografia humana e o próprio vírus. As descobertas ilustram que múltiplos fatores contribuem para os padrões dos surtos de dengue, enfatizando a necessidade de monitoramento e pesquisa contínuos. Compreender essas dinâmicas será crucial para as respostas de saúde pública para mitigar os impactos de surtos futuros de dengue e melhorar a eficácia das estratégias de prevenção.
Com a dengue continuando a ser uma preocupação global, especialmente no Sudeste Asiático, é importante conduzir vigilância para rastrear a evolução do vírus e as mudanças nas populações afetadas. Estudos contínuos ajudarão a aprimorar nossa compreensão dessa doença intrincada e como melhor responder aos seus desafios.
Título: Climate, demography, immunology, and virology combine to drive two decades of dengue virus dynamics in Cambodia
Resumo: The incidence of dengue virus disease has increased globally across the past half-century, with highest number of cases ever reported in 2019. We analyzed climatological, epidemiological, and phylogenomic data to investigate drivers of two decades of dengue in Cambodia, an understudied endemic setting. Using epidemiological models fit to a 19-year dataset, we first demonstrate that climate-driven transmission alone is insufficient to explain three epidemics across the time series. We then use wavelet decomposition to highlight enhanced annual and multiannual synchronicity in dengue cycles between provinces in epidemic years, suggesting a role for climate in homogenizing dynamics across space and time. Assuming reported cases correspond to symptomatic secondary infections, we next use an age-structured catalytic model to estimate a declining force of infection for dengue through time, which elevates the mean age of reported cases in Cambodia. Reported cases in >70 year-old individuals in the most recent 2019 epidemic are best explained when also allowing for waning multitypic immunity and repeat symptomatic infections in older patients. We support this work with phylogenetic analysis of 192 dengue virus (DENV) genomes that we sequenced between 2019-2022, which document emergence of DENV-2 Cosmopolitan Genotype-II into Cambodia. This lineage demonstrates phylogenetic homogeneity across wide geographic areas, consistent with invasion behavior and in contrast to high phylogenetic diversity exhibited by endemic DENV-1. Finally, we simulate an age-structured, mechanistic model of dengue dynamics to demonstrate how expansion of an antigenically distinct lineage that evades preexisting multitypic immunity effectively reproduces the older-age infections witnessed in our data. CLINICAL TRIAL NUMBERSNCT04034264 and NCT03534245. SIGNIFICANCE STATEMENTThe year 2019 witnessed the highest number of dengue cases ever reported, including in Cambodia, a Southeast Asian country with endemic transmission. We analyzed 19 years of national dengue surveillance data for Cambodia to demonstrate how increasing temperature and precipitation enhance similarity in dengue incidence across space and time, particularly in epidemic years. We document how two decades of demographic transition has depressed the rate at which dengue infections are acquired, thus increasing the age of reported infection. In 2019, expansion of a genetically distinct DENV-2 lineage into Cambodia likely underpinned repeated symptomatic infections in older-age individuals to drive high caseloads. As climates warm, we anticipate more synchronized dynamics globally and a shifting burden of symptomatic disease into older cohorts.
Autores: Jessica E. Manning, C. E. Brook, C. Rozins, J. A. Bohl, V. Ahyong, S. Chea, L. Fahsbender, R. Huy, S. Lay, R. Leang, Y. Li, C. Lon, S. Man, M. Oum, G. R. Northrup, F. Oliveira, A. R. Pacheco, D. M. Parker, K. Young, M. Boots, C. M. Tato, J. L. DeRisi, C. Yek
Última atualização: 2024-07-15 00:00:00
Idioma: English
Fonte URL: https://www.medrxiv.org/content/10.1101/2022.06.08.22276171
Fonte PDF: https://www.medrxiv.org/content/10.1101/2022.06.08.22276171.full.pdf
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